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27 março, 2011

Falamos da solidão

17 maio 2007



Falamos da solidão como um mal em si, mas ignoramos que a solidão tem
outras conseqüências. A solidão reduz a qualidade da vida, piora a saúde e até
contribui para ideações suicidas.
A solidão tem marcadores, pontos na vida que mudam o nível. A saída dos filhos e filhas de casa é um deles. O telefone ajuda (e, recentemente, a internet também), mas não substitui o contato pessoal diário. Há compensações com os netos, mas a mobilidade geográfica e social dificulta o contato com eles. Na média, ficamos mais sós.

A aposentadoria é outro marcador. Em vários
países industrializados há perda de salário e,  geralmente, as pessoas só
se aposentam no final da carreira. No Brasil ela pode ser precoce,
particularmente para os que trabalham no setor público e é vista como uma
vantagem. Porém, em todos os lugares ela reduz, quando não elimina, os contatos
do trabalho.
Além de retirar esses contatos sociais, cria um tempo vazio, oito a 10 horas diárias a serem preenchidas. Todos os dias.

É preciso sabedoria e ânimo para lidar com isso.
Com certa freqüência, a aposentadoria cria um overload da relação conjugal,
aumentando tensões.
Os problemas de saúde são um marcador diferente, mais espalhado: crescem com a idade.
Eles reduzem os contatos sociais diretamente, mediante restrições inevitáveis, e indiretamente,
às vezes por meio da depressão e até de obsessões com temas próprios da velhice.

O último marcador, a morte do cônjuge, é o mais
terrível: não é por acaso que muitos viúvos e viúvas morrem ou adoecem gravemente nos anos logo após a perda do companheiro.
Um pesquisador, Lopata, concluiu que a solidão era um dos principais problemas das viúvas
americanas, e Korpeckyj-Cox demonstrou que os viúvos e as viúvas classificavam seu nível de solidão bem acima dos casados. Essa diferença se mantinha houvesse ou não filhos adultos presentes na casa. Ou seja: filhos na casa atenuam, mas não eliminam a solidão causada pela viuvez.

A solidão não é biológica, companheira inevitável da idade: na década de 80, Delisle sumarizou
pesquisas em vários países, concluindo que a percentagem de solitários varia de menos de 20% a

mais de 60%. Essa ampla variação indica que condições
sociais e políticas influenciam a solidão. Há
mudanças históricas que favorecem a solidão: nos Estados Unidos, a percentagem dos domicílios

com apenas uma pessoa aumentou de 4% em 1790 a 9% em 1950, 13% em 1960, 18%
em 1973, e 24%
em 1990. O mesmo acontece mundo afora, inclusive no Brasil, onde já vivem sós 16% das mulheres e
6% dos homens, inclusive 26% dos idosos com 80 anos e mais.

A solidão tem dimensões objetivas e subjetivas que influenciam a qualidade
da vida. A percebida
também está intimamente associada com a saúde de idosos, assim como com o maior uso de remédios, com visitas mais freqüentes a médicos, hospitais e clínicas. Não é uma relação de causa e efeito, mas uma interação constante: a solidão aumenta a doença, que afasta amigos e até família, o que aumenta a solidão e assim por diante.

Há formas específicas e perigosas da solidão:
Bearman, Udry e Moody analisaram dados sobre 13.465 adolescentes concluindo
que a ausência ou escassez de contatos com outros adolescentes estimulava ideações suicidas, particularmente entre meninas. Essa relação vale para idosos: na Austrália, Vanderhorst e McLaren demonstraram a íntima associação entre depressão, ideações suicidas e baixo apoio social.

Amigos trazem mais do que amizade: trazem vida.
Uma pesquisa na Califórnia demonstrou que as pessoas com
muitos amigos e contatos viviam, em média, nove anos a mais do que os com relações
pessoais e sociais escassas. E, convém lembrar, a sociabilidade beneficia todos os participantes.
O trabalho voluntário e as visitas a pessoas carentes e sós estão entre as
atividades recomendadas
para enfrentar depressões leves e moderadas associadas com a idade, a doença e a solidão. Um professor aposentado de português da Universidade da Flórida, Al Hower, vivia só e padecia de graves
problemas crônicos de saúde. Não obstante, levava, diariamente, uma cesta básica de alimentos
a pessoas carentes, atividade que lhe rendeu muitos amigos e vários anos inexplicáveis de sobrevida. É

uma ironia bonita que, tentando fazer o bem, ajudar os
demais, ajudemos a nós também.